Há roupas, estilos e detalhes que sempre voltam e essas tendências dos primeiros tempos de Coco Chanel são apenas alguns exemplos que aparecem nas colecções da Primavera de 2021.
Nas passarelas de 2020 vimos as silhuetas dos anos sessenta e as suas estampas. O ar boémio dos anos 1970 e o seu espírito escapista foram transferidos para as pistas de dança do Studio 54 e Le Palace. Esta tendência disco não vai desaparecer por completo em 2021 (os metálicos de Isabel Marant ou as lantejoulas de Louis Vuitton deixam claro), mas é verdade que, tendo em conta certas características que vimos nalgumas das colecções principais, poderíamos dizer que os loucos anos 20 também estão de volta. Pelo menos esteticamente.
Estilo cintura que cai

Vestidos da Chanel, Dior e Alberta Ferretti na Primavera de 2021
Uma das características mais curiosas na análise das colecções Primavera 2021 é que além da cintura alta, outro factor entra em jogo na definição da silhueta feminina. Tão típico quanto a corte imperial entre o final do século XVIII e o início do século XX ou a baixa ascensão no início dos anos 2000 foi a omnipresente cintura dos anos 1920: em vez de ocupar a sua posição natural, caiu alguns centímetros, quase até aos quadris, para dar à figura feminina uma aparência mais andrógina, alongando visualmente o tronco e desfocando a linha da cintura. É um tipo de corte que já vimos nos vestidos românticos e bordados da Chanel, Alberta Ferretti ou nas transparências da Dior. E também, é claro, na Loewe, uma das empresas que passaram de reminiscências históricas, como a guarda infantil, para referências um pouco mais recentes. O efeito não se consegue apenas ao nível dos padrões, mas também estilístico: já o vimos, por exemplo, na Chanel, combinando em conjuntos subtilmente semelhantes aos dos anos 20, saias midi plissadas com malhas no topo que cortam a altura do quadril. O mesmo acontece com outras combinações, como camisolas ou fatos de treino que combinam o nº 21 nas saias de penas.

Combinação de saia plissada e camisola de malha marcando uma cintura baixa na Chanel Primavera 2021 e um look da maison de 1926.
Vestidos ‘robe de style’

Túnica estilo 1925 da Lanvin, recriada na proposta de Primavera de 2021 da casa.
Com Jonathan Anderson já estamos acostumados a ver como é possível que silhuetas historicistas possam ter lugar numa passarela actual, mas não com Lanvin. É por isso que a sua colecção Primavera 2021 é uma surpresa (muito) agradável para os fãs da época de ouro de Jeanne Lanvin. Pensando nas mulheres mais conservadoras da sua época, que não queriam parecer tão andróginas, a estilista criou uma espécie de vestidos mais românticos que emulavam subtilmente o diciochesco que o guarda-crianças deu.
No caso do robe de style, a silhueta descia até aos quadris, onde se alargava subtilmente em ambos os lados. “Gosto da ideia de uma reedição. Mas nunca vimos esse vestido na vida real, nunca o experimentamos. Pertence ao [Museu] Galliera. Gosto de pegar a iconografia, sentir e fazer algo além do moderno”, comentou há alguns meses o seu director de criação, Bruno Sialelli, a respeito desse vestido. O engraçado é que além da silhueta, na proposta de 2021 podem ver-sr modelos quase literais que incluem também o arco frontal com jóias, como um robe de style do estilista de 1925, também imortalizado na ilustração de ‘La Cavallini’ nesse mesmo ano.
Nas bainhas largas da Loewe também podemos ver subtilmente os ecos deste vestido típico da década. Já Christopher John Rogers aposta no esvaziamento do quadril com uma moldura mais geométrica, mas que compartilhe dessa mesma arquitectura delicada.

Christopher John Rogers e Loewe Primavera de 2021, subtilmente imitando o ‘robe de style’.
Penas

Penas, uma das tendências vistas no Nº21, Fendi e Blumarine Primavera Verão 2021.
As penas voltam ao primeiro plano em 2021 e embora não sejam em si um detalhe exclusivo dos anos 20, fizeram parte dos vestidos mais elegantes da década. Os designs da tarde incorporaram toda uma fantasia de materiais que ajudaram a dar um toque mais delicado à silhueta andrógina. Além da jibóia clássica que vem à mente, penas foram usadas para decorar profusamente as bainhas dos vestidos e xales combinados, como em alguns desenhos Patou. Um gesto que vimos na passarela de firmas como a Nº21 ou a Fendi, curiosamente, com peças sobrepostas que também transferem opticamente da cintura para as ancas. Já a Blumarine inclui penas nos punhos e no pescoço num gesto nada discreto.
Calças pantalonas de cetim

Calças de cetim das marcas Boss, Armani e Halpern Primavera 2021.
No meio do caminho entre o agasalho mais folgado e o pijama, parecia uma consequência lógica dos rumos estéticos tumultuados de 2020 termos acabado por cair na elegância das calças de pijama de cetim. É o máximo que pudemos ver, por exemplo, em Boss ou Armani, em tons subtis de azul que agregam vestidos superiores combinados. O mesmo acontece, mais obviamente, com Halpern. Algumas referências de rua que não nos escapam: muito, muito antes do pijama dar o salto da cama para o asfalto, ele tornou-se o uniforme feminista para as mulheres irem à praia. Os ‘pijamas de praia’ foram um oásis para as mulheres na década de 1920, um dos poucos locais onde podiam usar calças (símbolo, na época, de emancipação). A moda é atribuída, claro, a Chanel, que transformou o pijama dos ingleses na vestimenta mais desejada pelas senhoras ricas que iam curtir as praias de El Lido ou da Côte d’Azur.
Vestido de jóia

Vestidos Jewel em Louis Vuitton, Lanvin e Burberry Primavera Verão 2021. O facto de Coco Chanel ter varrido todos os excessos da Belle Époque faz-nos ter em mente 20 anos de austeridade absoluta em vestidos e fatos. A resposta é sim … mas não. Porque a simplicidade formal das silhuetas foi contrabalançada por diferentes fórmulas numa década que de forma alguma foi minimalista. Influenciados pelo makie (laca de ouro japonês), os tons metálicos e o lamé estavam na ordem do dia. Claro, também há detalhes como strass: em frente ao LBD da Chanel, a estilista também passou a década de 1920 apostando em vestidos jóias como esta peça, coalhada de cristais, de 1924. Não há estilista que não apostou nesse detalhe ornamentado: o As irmãs Callot, mentoras de Madeleine Vionnet, também faziam joias e vestidos em tons metálicos com strass, miçangas e cristais. Olhando para 2021, a Lanvin é uma daquelas que literalmente retorna àquela nostalgia da década, enquanto Louis Vuitton e Burberry optam por outras mais blindadas, quase típicas dos anos 60, mas que mantêm aquela máxima nada discreta dos época.
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